(I)
Esta janela já não tem enredos
ninguém por ela espreita, ninguém espera
vê-la semicerrar, semiabrir
o olhoblíquo verde do ciúme;
nem por ela passarão as trajectórias
do suicida e do escalador.
Romeu morreu e a doce expectação
de Julieta é comprimido sono.
Sequer uns braços nus de janeleira,
hasteada brancura, nela podem
demorar o gozo dum voyeur,
que esta janela já não serve para...
Esta janela é uma finta, é uma jogada
no xadrez de quem a pinta e assina.
(II)
Se transcorridos que forem muitos séculos,
uma janela destas ainda se encontrar
e, por detrás do vidro o açaimoxigénio
duma criança (punhamos loura) se entrevir,
é que alguém (em que centúria?) entrou no quadro
à revelia dos lances do esquema
inicial. Vindouro não remontes
o tempo, que o quadro é o que vês.
Se o que devora até os mármores mais grossos
a criança lá pôs, contrariando
a usura, que é o seu procedimento e etiqueta,
caberá, ó vindouro, falar de uma autoria?
A cada um seus lances; ao tempo os seus.
Maluda jogou por procuração.
(Alexandre O'Neill)
A autora da janela faria hoje 71 anos.
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2 comentários:
eu, pássaro das suas janelas, ergo o meu cálice.
:-)
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